STF rejeita tese do marco temporal e garante avanço na demarcação de terras indígenas
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O Supremo Tribunal Federal (STF) definiu, por 9 votos a 2, que a tese do marco temporal não deve ser aplicada em processos de demarcação de terras indígenas. A decisão foi tomada na sessão de 20 de setembro e encerra disputa jurídica iniciada em 2021, colocando indígenas e ruralistas em lados opostos.
O que dizia a tese
Pelo entendimento derrubado, somente poderiam ser demarcadas as áreas ocupadas por povos originários em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. O argumento era uma leitura literal do artigo 231 da Carta Magna, que reconhece “os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam”.
Posicionamentos
- Contrários: povos indígenas, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e organizações como o Instituto Socioambiental (ISA) defendiam que muitas comunidades foram expulsas de seus territórios — especialmente durante a ditadura militar — ou possuem caráter nômade, o que inviabilizaria a comprovação de presença em 1988.
- Favoráveis: ruralistas, parte do agronegócio e o ex-presidente Jair Bolsonaro argumentavam que a tese traria segurança jurídica e evitaria desapropriações de propriedades privadas.
Possíveis impactos se o marco fosse aceito
Se o STF tivesse validado a tese, comunidades poderiam ser removidas das áreas atuais ao não comprovarem ocupação na data constitucional. Demarcações em curso seriam paralisadas e terras passíveis de proteção poderiam ser privatizadas, atendendo a interesses do setor rural.
Como o tema chegou ao STF
- 2013 – O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) aplicou o marco temporal ao conceder reintegração de posse ao Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina em área da Terra Indígena Ibirama LaKlãnõ.
- 26 de agosto de 2021 – O STF iniciou julgamento de recurso da Funai contra a decisão do TRF-4.
- 20 de setembro de 2023 – A Corte concluiu o julgamento e rejeitou a tese.
Ao final da sessão, Tucun Gakran, liderança do povo Xokleng, declarou que o resultado representa “a maior vitória dos indígenas desde que o não indígena tomou suas terras”.
Voto dos ministros
Contra o marco temporal: Edson Fachin (relator), Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Rosa Weber.
A favor do marco temporal: Nunes Marques e André Mendonça.
Imagem: CARLOS ALVES MOURA via g1.globo.com
Situação no Congresso
Paralelamente, o PL 490/2007 busca transformar o marco temporal em lei. O texto, que altera o Estatuto do Índio, prevê:
- Direito às terras apenas para povos que as ocupavam em 5 de outubro de 1988;
- Possibilidade de contratos de cooperação econômica entre indígenas e não indígenas;
- Abertura para contato com povos isolados em ações de “utilidade pública”.
A proposta já foi aprovada pela Câmara em 30 de maio de 2023 (283 votos a 155) e, no Senado, teve votação na Comissão de Constituição e Justiça adiada para 27 de setembro, após pedido de vista coletivo.
Com a decisão do STF, processos de demarcação voltam a considerar a ocupação tradicional dos povos indígenas sem limite temporal, reforçando o direito originário garantido pela Constituição de 1988.
Com informações de G1